sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Ao não nascido

Tu me corrompe, tu me escamoteia, tu me sangueia
eis o sacrilégio, tu insiste em ser profano
tu insiste profanar
o sagrado não te importa
aquilo que já é não te importa
isto não te importa, quer seguir adiante
fugir deste inatismo que se confunde com inativismo
é um basta que tu me oferece
tu insiste em me mostrar as fronteiras do sagrado
e mostrar os terríveis pedágios que o separam da profanidade
o preço? esta pele comprimida chamada víscera
esta pele que fora encorpada e lhe chama ao combate
É na fronteira que tu surge
eis o arauto de minha descolagem
das raízes que se entranham na chuva pasmada
na terra suspensa, que abre minha pele à fragilidade das rosas
e às durezas de seus espinhos
eis a residência de meu coração, bomba anatômica
Hiroshima das fronteiras, é tu, tu que não nascestes
portador de minha vida e minha paixão
e eu, apenas deixo o gesto da morte, pois compreendo
sou apenas uma de tuas passagens...

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Amor hackeado

Viral, não há racionalidade senão caótica para uma política desejante
Like a wolf, like a bot, how can we survive?
with a lovebot inserted in your skin
endless information taking flow
flows of desires
inomináveis a uma certa língua, que por mais afetiva seja
não, non, je ne peut pas, je ne ma peut pas
even if we really don't know what we are talking
oui, nous sommes en vie, vivre vite
mesmo quando a cada instante uma nova informação nos desestabiliza
e o incongruente te supera, supera pelo diferencial das velocidades
medida diferencial, always, toujour, sempre
e ao sangue, damos
to the blood, our souls
como um vírus, dissemina, não há respeito para vírus
and how a love, a passion can be respectful
when it spreads as the virus spreads
through air, through skin, through blood
disrespectful senses, je ne comprend pas
porquoi il me rattrape?
Queria dar o nome de uma angústia, mas angústia não basta
nameless shall it be,
but I still ask me why, why get lost again, and again
why not sau what is important, what is essential
não falamos jamais o que nos é fundamental
medo de assolarem nosso chão?
fazer a terra vazar sob nossos pés?
Lost our soil, if we lost our soil, will we lose our fertility
Não quero ser a margem do rio, primeira, segunda ou terceira
mas também não quero ser a gota do rio
one drop who thinks that is ocean
the truth, maybe i'm scared
haunted by the view of an endless point
leviathan point
Vírus Leviatã, vírus das passagens grandes demais
sem firewall que o combata
mas quem formata nesta hora
une coeure qui ne veut pas être plus laconique

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Cal-tô

O performer entra em cena, dividido, víral
vírus tigrais, vírus criançais
à dinâmica sem serviçais
vírus da doença, ao lado de vírus relacionários
Um corpo, dois(!?) organismos de máquinas diversas
Adversárias, os pulsos entram em grito
chocam, explodem!
Os pêlos de tigre invadem a face
o sangue de criança adentra a animalidade
Outro habitante, outro sem órgãos
aclopa, energia impura, carnosa visçosa
energia impura, fabuladora sutil
Multigestualidade

domingo, 5 de dezembro de 2010

Intenso, eis

Intenso, eis o movimento sem fim, pois os movimentos terminam, mas jamais terminam em algum lugar, algum canto recôndito de minha alma ou de minha escrita, o fim, o fim, este não me existe, o fim, e o juízo do fim apenas me deixam à cara atravessada, à cara larga sem volta. Intenso, eis meu mapa, ou seria meu cartograma, tudo à lápis, traçado com a pele, traçado à pele, tinta e sangue. Sangue de outro, brisa de outro, suor de outro, eis meu reino, às traças e aos traços, à organificação e seu desfazer, ao corpo rebelde. Corpo rebelde. Rebelde é corpo que já não é o mesmo, rebelde é o corpo do outro que te apossa, rebelde simplesmente rebelde. À tua vida sem temor, pois só o juízo teme, e o juízo odeia o rebelde, tal como odeia o outro. Mas a cada palavra, esta brisa sem chão, ao mar que me é lançado, um outro traçado perfura minha pele, e teu corpo rígido, corpo feito de juízo e de outro me tortura. Por que não ser rebelde? Por que não deixar teu juízo de lado, juízo da providência? Pois me deixe em paz carrasco, carrasco que me habita, me fere e me ativa. Carrasco que incita minha rebeldia, pois sou teu outro que me habita, à passeio de um homem, ao passeio de homens. Luzes, câmera, inércia. A ação apenas intensa, jamais as câmeras captaram a ação, mas uma série de inércias à teu peito, e por que não falar do coração, tu que me desorganifica e joga aos ares minhas amadas hierarquias entre corações, fígados e pele, entre sentimentos e pensamentos e vidas, e nem falar as mortes que me desfizeram, sem parar, continuamente é pouco, pois jamais foram contínuas. Cisão e erosão, jamais deixei de ser geólogo, jamais deixei de ser terra, mesmo que digam que sou aéreo, sou terra que se engole. Fraturas, fissuras, reformulações, transformações. Tudo para despedeçar as personagens de meu juízo. Intenso que me abriga sem coesão, pois o campo está aberto, e tal como a terra, desde sua superfície à seu magma tudo é descontinuidade, descontinuidade corporal, descontínuo de espírito, espríto pra alguns. Apenas uma pequena luz que ilumina ora cá, ora lá para ver teu corpo sob as frestras da janela, janela que tu nunca entendera, janela vibrátil, incapaz de ver com a perfeição que tu desejas. Sou teu outro, já lhe disse, pois tu me é outro, como falara, antropofágico, gosta, se não ama devorar os homens, devorar teus espíritos para uma mudança radical. Não. Ser não há mais, mas processos, feixes, feixes de ossos acoplados, feixes de distensões. Como não te incluir em meu mapa, como não devorar você em meu estômago? Teu cheiro, tua pele, tudo orgânico, orgânico demais para mim, e por isso tu me altera tanto. Alteridade viva, fator de alterificação. Tu lês aqui e vê droga no ar, mas não, não há drogas, não há intoxicações, apenas tóxicos demandantes. É preciso fazê-los passar, os tóxicos lhe pedem passagem que não é a endogenia, não é pra dentro, mas teu sangue deve cair aos tóxicos, ativar fluxos em sobriedade que o juízo não lhe permite. Tu me dizes loucura, mas loucura não é introjetar tudo que aos olhos brilham. Um universo te toca, é preciso seus devires, surfar nestas ondas de lugar nenhum, tocar o juízo para lugar nenhum. O corpo se cansou de ti, mas não de tu. Sei que não entendes, és o paradoxo! O corpo se cansou do mesmo, cansou de ser o mesmo, de processar o mesmo. O corpo quer se rebelar de ti, o corpo que rebela. Já não posso, já não pode, já não podemos, a inércia retornou. Quero teu movimento, tu quer meu movimento, somos duas vidas ausentes sem eu e tu outro, o mesmo faz da ausência uma vida, deslocada do juízo e sua totalidade, totalização orgânica. Deslocar, descolar o orgânico, rumo ao mineral se torna necessário, atingir a mineralidade e, enfim, enfim nada, a preciosidade não está em um fim, apesar que os meios remetam a um fim. Não, é experimentar o anorgânico, o formal rumo ao informe, experimentar a intensidade do informe, a intensidade de nosso encontro, nossa conjugação, onde não se tece mais eu, tu, mesmo e outro, mas um nós sem fim.