quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

à ti, desertor

Em outros trópicos, nada diria
mas cá ao sul
tu que se indigna com minha matilha
tu que torna indignas nossas crianças
lhe pergunto um por quê
e retorna uma resposta atravessada de silêncio
o que há de tão tenebroso, tão monstruoso em nossas criações
que agora desejas parar
que agora desejas deixar passar
e simplesmente passar
não lhe perguntei de qual específico
pois estes tu aguenta menos ainda
imagine quando estas monstruosidades apenas, movimentam
que há de raio, que há de sol em teus sorrisos
que tanto assusta tua petrificada fáscia
eu insisto em desejá-las, plasmá-las
entorpecer-me com elas, abrigá-las
gestar cada gesto, cada fala, cada minúcia
cada ovo implantado sob minha pele
ovo de pequenas monstruosidades
ovo de grandes intensidades
prestes a chocarem
liberando o tempo de tua presença

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

O que eu explico?

Tu queres meus pequenos respeitos. Eu quero teus grandes desvios. Tu queres saber o quanto fiz. Eu quero saber o que tanto fará. Tu queres me cobrir, eu quero teu avesso. Quero querer, queres querer, quereres. Quereres a cada vírgula, quereres a cada esquina, quereres a cada ponto. E entre eu e tu, cansamos, eis o nosso momento. Não bastou-me cansar, não bastou-te cansar, foi preciso cansarmos. Cansar de respeitos e caminhos, ídolos e desafetos, verdades e mentiras, foi preciso cansar. Foi preciso cansar do tempo, do espaço e da vontade. Foi preciso cansar de ser homem, foi preciso cansar de ser animal. E o engraçado é que a repetição não cansa, estabelece suas raízes em terras aéreas, como se as margens fossem milimetricamente movidas por ventos e mudanças ocorressem a cada brisa, como se o território margeasse em novos traçados sem ser posto em ruína. Explicar? Não sei nem o quê nem como. Apenas um cuidadoso, fica a dica!

domingo, 16 de janeiro de 2011

Uma imagem, um modo de vida

Afinal, quem tem um corpo? Afinal, um corpo movido a quê? Afinal, por quê raios falamos do corpo sempre em um fim!?
Vamos botar o afinal de lado e pôr as coisas em panos claros e escuros, aveludados e ásperos, transparentes, vibrantes, opacos, pesados. Nada de claridades redentoras, nada de essências justificadoras, falemos que nem gente grande do corpo, com fantasia e imaginação, e sem apego à definição.
Oras, percepções corporais são diferentes: um atleta, um serralheiro e um burocrata não têm o mesmo corpo. O que ativa o corpo para cada um é tão diverso, mas não nos enganemos, jamais se ativa o corpo em sua totalidade! A ativação é modal! Ativo o modo escrita de meu corpo regado à coca-cola, outros à álcool, e outros simplesmente não ativam, pois outros circuitos estão em jogo.
Ativamos esquizofrenia e neurose, alegria e nojo, pavor e amor. Ativamos sensíveis, paixões.
E os efeitos de superfície? E a vibratibilidade da pele? O timbre da voz, da garganta, do estômago?
Ativamos defesas sem cessar, defesas contra o outro, defesas contra a falta de terra, defesas contra este movimento indisciplinar do próprio corpo.
Como um fio, o trançamos em um determinado ponto inúmeras vezes, para que fique bem preso, embolotado, estável, ou como dizem as más línguas, "centrado".
As mãos que tecem o fio só não percebem que são o próprio fio, e em determinado momento, mãos embolotadas.
Quanto tempo despendido para retornar os fluxos em corpo centrado, ainda mais quando o coro dos centrados agem como mãos que não desembaraçam o outro, aglutinam em torno do bolo para proteger a si mesmas do que é diferente em si e nos outros.
Extensão? Não, uma bola de neve bem no cume, bem equilibrada de uma montanha que só cresce. Uma hora territórios movediços encontram a montanha, e terremotos acontecem. Avalanche de centrados abaixo a colina.
Sorte que o corpo é feito de fios de pontos desconexos! Se desaba, outra forma atualiza! Se aglutina, desconecta aqui, agencia acolá!
Mas a imagem sempre fica em desatino quando se fala de corpo, o corpo sempre parece ser mais real, mais excessivo e volátil que a imagem. É um desafio domar o corpo, mas quando se trata da imagem, é como sempre estivesse no mesmo lugar, tão ilusória quanto falsa, sendo apenas um efeito do corpo.
Separar o corpo de sua imagem, e a imagem de seu corpo não seria reafirmar uma longa dicotomia, daquelas que adora aparecer para mostrar que séculos passam, mas continuamos a pensar em termos de dualidades? Imagem é um efeito histórico do corpo, a materialidade do corpo produz suas imagens e a sensibilidades para captá-las. E a história e sua materialidade sempre escondem seu duplo, o fetiche pelo corpo esquece o processo de produção do corpo por suas imagens, seus esquemas, anatomias e representações.
Um corpo chinês e um corpo americano, um corpo europeu e um corpo africano certamente não são os mesmos, por mais que uma "ciência" diga que todos tenham as mesmas estruturas, mesmas simbologias ancestrais. Universalizam as estruturas para universalizar os modos de vida.
E pelo tempo que me é concedido, antes uma imagem que desaba e produz outros corpos, do que um já configurado pela bioengenharia.

sábado, 15 de janeiro de 2011

Uma orgânica, dança

Que o pensamento do baço
atualiza em teu braço
a pele, feito aço
naquele sutil abraço

Como sem fim,
trouxe a meu partir
aquele pano
aquela zona

Em teus lábios, teu coração
em teus olhos, ardente paixão
como um autor, é tua ação
como um cisne, levitação

Como sem limite,
trouxe a minha espera
aquele sonho
aquele cânhamo

Nada que uma licença poética

para ao alto jogar a ética

Nada que o corpo

em indisciplina radical

não margeie, não escape

dos limites de nosso excesso

domingo, 9 de janeiro de 2011

Penso

Penso que a cada espera, um leve desespero bate à esquina.
Penso que a cada momento, um sombrio desejo toca a campainha.
Penso que a cada instante, não quero o pensamento à minha porta.
E de tanto pensar, esvaziei.














Penso, a cada espera, o desespero


Penso a escrita pela ferida