sábado, 25 de julho de 2009

Encantos de blogar-se

Estou cansado de ouvir as pessoas falando que o blog é mero diário cibernético onde colocamos as narrativas de nossa vida e as tornamos públicas por uma imposição midiática decorrente do capitalismo e da sociedade do espetáculo. Estou cansado de ouvir que o blog é um instrumento de reafirmação identitária, que ele nada mais é que um canal de comunicação e que só desocupados perdem seu tempo com eles.
Já estou cansado, esgotado desses papos monistas que dizem que algo só é útil se houver um princípio por trás do que se faz, que o blog só é útil quando providencia um insight ao leitor ou ao escritor, gente que fala mal de blog e que ressalta as verdades indubitáveis das revistas semanais, e acreditam fervorosamente nos padres dos telejornais.
Se eu tenho algum objetivo com meu blog? Tenho, mas é bem diferente da opinião dos especialistas. Aqui não é um lugar de escapismo do mundo, onde eu fico meramente a deriva de meus sonhos e devaneios, reapresentando, meus conflitos, minhas dores, minhas alegrias. Muito pelo contrário, aqui é onde experimento a intensidade do mundo, onde percorro esse campo de intensidades, não de histórias já escritas e pontuadas, se há histórias, apenas as que podem ser constantemente reformuladas.
O blog é um laboratório, um laboratório de experimentações. Aqui eu não afirmo um Eu, um Self, um Si mesmo, aqui eu os crio e os experimento, e posso fazer uma brincadeira sem cerimônias de mudança de Si, ou mesmo negação de Si, posso brincar de artista, de poeta, de cientista sem que eu seja algum deles, posso brincar de heterônimos como Fernando Pessoa o fazia.
E posso conviver com a multiplicidade dentro de mim, sem querer negá-la ou reduzir a uma unidade. Posso ser um materialista e espiritualista ao mesmo tempo, posso ser cristão, judeu e ateu sem dor de cabeça, e posso ser nada disso, pois ao não afirmar uma identidade em detrimento das outras, você está aberto para experimentar o sensível em cada particularidade, você se torna alguém com largueza de alma.
Você não precisa percorrer um esgotamento de identidades, um esgotamento das possibilidades de “mascarar” a si mesmo, nesta lógica, pois aqui não se testa para saber qual é melhor e qual é pior, a gente testa para saber se em tal momento as intensidades que formam aquela identidade estendem ou contraem minha pele. Não é a questão de um espírito já pronto que abre os olhos e nós temos que nos adequar a ele, esse espírito está em constante expansão, expansão de subjetividades, expansão de virtualidades, expansão de sensibilidades.
Não temos algo pronto, algo ready-made que pegamos e temos de desvelar. Por sinal, o ready-made surge após a industrialização, na idéia de produção massificada e da qual o homem não tinha contato direto com o produzido, de um lado a fábrica entrava a matéria-prima, e do outro sai o produto, e a maioria de nós só via o produto e achava que era assim, por mágica que as coisas funcionavam.
Não nascemos prontos, nascemos para crescer e alargar, para construir e criar, não nascemos para desvelar uma subjetividade humana que é una, irredutível, original, é por sermos centelhas, átomos e moléculas de sensibilidade que se unem numa explosão fotoquímica que criamos a singularidade de um ser. Ser animalidade, ser humanidade, ser divindade.

terça-feira, 21 de julho de 2009

Entre tantas coisas

A gente se acostuma...
A gente se acostuma nos dias frio de inverno a ficar debaixo das cobertas
A gente se acostuma a não abrir as janelas em dias de chuva
A gente se acostuma a olhar para baixo, a ver nada além de terra
A gente se acostuma a querer ficar em casa, e não sair por nada desse mundo
A gente se acostuma à mesma casa, à mesma pintura, aos mesmos móveis
A gente se acostuma a erguer um templo para a televisão
A gente se acostuma em viver em nossos quartos
A gente se acostuma aos mesmos canais, à mesma programação
Acostumamos a comer rápido, não conversar com aqueles na mesa
Acostumamos aprender apenas ouvindo
Acostumamos a sentar em cadeiras e esperar que a aula termine
Acostumamos...
Acostumamos a tanta coisa
Acostumamos com um relacionamento, só pelo status de dizer: “eu o tenho”
Acostumamos a não ver, a não olhar para os lados
Não ver as árvores e borboletas que estão nas margens de nossa trilha
A não ver o menino de rua, malabarista de farol e catador de papelão
Acostumamos a ouvir telejornais, rádios e MP3s
Deixamos de ouvir o canto dos pássaros, as ondas do mar batendo e o violão do amigo
Não ouvimos o jovem desesperado, o adulto drogado, o filho desesperançado
Acostumamos a usar remédios para acordar, pílulas para dormir, pastilhas para alegrar
Acostumamos a não sentir a brisa no rosto, a umidade da terra nos pés e o corpo do outro
Acostumamos a ficar longe, a nos proteger, a ficar frios e rígidos
Acostumamos a fugir daquele que vem adiante, desviar o olhar, fingir que olhamos o relógio
Acostumamos a ignorar o outro, e entre tantas coisas
Nossa alma, bela alma, acorda dia a dia esgotada
Desacreditada de nós

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Cyberderme- o sensível e a experimentação do mundo cibernético

A casa está em reforma, e meu quarto estaria sombrio se não fosse a luz digitalizada desse notebook. O mundo lá fora está frio, e o cobertor daqui de casa está tão aconchegante, vou ficar mesmo é no conforto!

Há um tempo atrás falei de corpo, e acho q vou continuar a falar de corpo. É um assunto tão interessante! Corpo-cristão, corpo-máquina, corpo-ecologia, corpo-indivíduo, corpo-social, corpo-mundo! Olhe que bonito: nós é que decidimos a extensão de nossos corpos, nós podemos decidir, em parte, onde a experiência de nosso sensível se faz.
Podemos ter um corpo estritamente biológico, um corpo fechado em si e o sentido é apenas aquilo que desencadeia uma descarga neuronal dos gânglios sensoriais aos lobos cerebrais, podemos ter esse corpo de orgãos, vasos e sistemas.
Podemos ter um corpo estritamente social, um corpo fechado não em suas estimulações mais materializadas, um corpo que pode estar cego para sua biologia, porém possui tamanha sensibilidade para questões da grupalidade, da política e do coletivo. Um corpo de rede, mas não necessariamente um corpo em rede, pois seu sensível faz ele aderir completamente à rede, mas não diferencia dela. Extrema sensibilidade e extrema insensibilidade lado a lado.
Horas e horas poderiam ser utilizadas para a discussão desses corpos aparentemente dissociados, porém eles estão tão imbricados na corporiedade como várias outras formas corporais. Nós urdimos e tecemos esse corpo, não temos uma linha, apenas um novelo e um modo de tecer, somos uma pluralidade de fios entrelaçados, que podem desfiar ou engrossar em alguns pontos da história.
Claro que é difícil imaginar um ser cibernético na Antiguidade, na Idade Média ou mesmo nos início da Idade Moderna. O Cyberespaço só costuma a ser pensado depois que inventamos o computador e a internet, porém o imaginário humano era recheado pelo ideário de um espaço de circulação de informações, pessoas, conhecimentos. A Biblioteca de Babel do argentino Jorge Luis Borges é um exemplo literário do homem em imaginar um espaço de fluxos de conhecimento e saberes.
As fantasias do cybercampo estavam começando a ser exploradas, e o imaginário explode numa finidade que se multiplica a cada segundo, o conhecimento, o saber, o sensível e a vida vem entrando numa dimensão praticamente sem volta. O Campo de experimentações se avoluma tanto que para permanecermos insensíveis às mudanças, somente isolados do mundo, e isto é uma força tremenda que é gasta para se afastar.
Várias barreiras são quebradas nesse mundo, o limite entre nossas personalidades humanas e a interface do Orkut, Twitter e outros sites de relacionamentos praticamente desmoronam, o paradigma público-privado também sofre altas transformações. E este é um novo mundo que passa a ser sensível para nossos olhos, nossos ossos, nossa pele.
Tal como a realidade psíquica tem sua dificuldade de encontrar um fato imutável que encontre um porto seguro que chegue a dizer isto é a Verdade, isto é o Real, a realidade cybernética apesar de ampliar nosso sensível, que eu ouso dizer de um devir-bits, um devir-telemático, ela tem suas dificuldades, seus problemas, pois ela também é tão variável e frágil quanto a psique.
Uma cyberpsique estaria aflorando nos dias atuais? Haverá um fluxo daquela subjetividade íntima com estes relâmpagos estrondosos do cybercampo?
Entre os mais jovens já percebemos uma fusão daqueles nossos corpos com os instrumentos da telemática: computadores, celulares, iphones, ipods, e seus universos, a internet, sites de relacionamento, blogs e fotologs. A velocidade desses jovens é supersônica, o que levamos horas para aprender, em dois cliques eles conseguem alcançar a resposta.
Nossos corpos são cheios de neurônios, vasos, orgãos, e os corpos desses jovens vêm carregados de chips e fibras óticas, seu sensível consegue se estender até o outro lado do mundo em busca de novas experiências, experiências virtuais tão reais quanto qualquer outra, porém essa longa distância de seu sensível poderia torná-los um sujeito longe-de-si? Eles têm um mundo gigante a ser explorado, mas será que esse mundo não lhe permitirá mais conhecer o mundo que está em sua vizinhança? Ou mesmo aquele mundo que muitos chamamos de sala e de família?

E não sei quanto a vocês, mas agora o único mundo que quero ver, mesmo nesse frio, é minha loba predileta =D
Abraços a todos!

sábado, 11 de julho de 2009

Corpos políticos! ... ou será uma política de corpos?

Têm-se falado muito nesta década sobre biotecnologia, esportes e saúde. Muitos dizem que hoje aquele corpo carnudo renegado no cristianismo e na idade média está voltando a ocupar um espaço de destaque na contemporaniedade. A quantidade de teses médicas de cunho biológico sobre o corpo, ou melhor dizendo, sobre esses orgãos do corpo vem crescendo dia a dia. E graças à hipermedia o conhecimento fabricado em uma universidade de Londres percorre extensas porções térreas, e até mesmo oceânicas, para chegar em um microcomputador que pode estar dentro de um instituto de pesquisa na África, numa faculdade da Índia, ou mesmo encontramos essa informação rodeando o cybernauta brasileiro.
Nunca tivemos acesso ao conhecimento tão rapidamente, e nunca fomos tão escravos dele quanto hoje. Podemos perceber que hoje, na sociedade dos autônomos , a autonomia garantida pelo conhecimento é uma faixada. Os especialistas das situações cotidianas se fazem necessários numa sociedade em que seus (des)integrantes são dominados pela insegurança dos vínculos socias, empregatícios e afetivos. A mãe há 5 décadas átras não tinha essa autonomia de cuidar de sua criança como nós temos hoje, ela não procurava uma nutricionista, um fisioterapeuta e uma série de bacharéis em meio a uma infinidade de ramos da saúde, o máximo em que esta mãe procurava era o pediatra da família. E a mãe do século XXI, o que ela faz? Dinâmicas e superativas nos ramos social e com altas pretensões em sua carreira, esta mulher tem uma autonomia a qual lhe permite a decisão, a escolha e o gerenciamento de sua vida que há 5 décadas só viamos os germes do movimento feminista, porém cada vez são mais procurados especialistas em sua vida, o endocrinonolgista pelos pneus laterais (exceto no caso daquelas que, sem medo e com poder aquisitivo, enfrentam o cirurgião plástico), o clínico geral para as freqüentes sinusites, o psicólogo para incentivá-la e tentar explicar porque os homens ficam pavorizados ao ver uma mulher madura, pois a maioria vive na infantilidade mental, e o personal coaching que vai treiná-la a obter altos cargos na empresa que atua, e claro além desses, ao invés de recorrer à antiga tradição oral que passa os cuidados e as minúcias dos bebês de mãe para filha, ela procura um profissional que teve mestrado, se não puder arcar com um doutor, das enfermidades e do modo correto de cuidar da criança e do adolescente.
É errado fazer isso? Não. Mas é esse o meio correto? Não necessariamente. E teria um meio correto de guiar a vida? Meios corretos, vidas ascéticas e todo tipo de preparação é um caminho para obter algo. Por exemplo, qual seria, teimando a um reducionismo fatalístico, o caminho correto para o budista? O budista pretende entrar em nirvana, um estado, ou melhor dizendo, uma transição que nos dá paz interior, um estado de relaxamento do corpo e da mente, e de comunhão com a vida. Porque prefiro dizer que nirvana é uma transição e não um estado? A paz não é apenas um fenomêno interno, ele depende da relação, do espaço que se forma entre aquilo que chamamos de si e o mundo, e o mundo é o Outro, a vida que interpassa e transpassa por nossas dimensões, seja material, linguística ou emocional entre tantas. E seu caminho passa pela corporeidade, por essa mistura de orgãos, sejam biológicos como a pele ou espirituais como os chakras, em um tal engendramento que o correto é obter uma comuna de paz, se seus poros denotam medo, tensão ou algum tipo de pretensão, seu corpo fecha, sua energia estanca, seus músculos contraem, formando blocos, couraças nesse corpo, negando o movimento deste, e em que mundo alguém enjaulado está em paz? Já se viu algum acorrentado, algum enforcado relaxado? E claro, ele está muito menos em paz.
Agora o caminho correto de um militar é diferente do caminho búdico, enquanto este quer comungar com a natureza, o militar quer colonizar, dominar a natureza e a vida, então seu primeiro movimento não é em sentido de um corpo vivo, mas de um corpo arma, a corporeidade é mero instrumento para dominação, é um corpo semi-esgotado, suas possibilidades desvribaram-se, apenas restou a guerra percorrendo suas veias, esse corpo não é o corpo de prazeres ou de desejos, esse é o corpo do aniquilamento. Para dominar algo ou alguém, você deve abdicar de uma coisa preciosa e frágil como uma flor perto de um vulcão, o vulcão é nossa potência de destruição, e a frágil flor repousada no leito rochoso é nada menos, nada mais que a vida. Para dominar o vulcão tem que explodir, deve haver algum desequílibrio, seja sísmico, seja nas concentrações rochosas do magma, ou tirando das metáforas, algo deve se passar seja nesse espaço que reservamos a vida interior, seja no Campo da existência, e essa lava fluente pulveriza em segundos a pequena e mirrada flor. A flor só cresce num ambiente de celebração, e isto não quer dizer que a vida só valha nos momentos de alegria como gostariamos de supor, a celebração que digo não é uma festa egóica de ressaltar nossas conquistas, nosso novo cargo da empresa ou nosso meio século de vida, celebrar não é apenas da dimensão positiva da vida. Celebra-se a dor, a tristeza, mas isso não é apologia do sofrimento ou da depressão. Aquele que ouve não com os tímpanos e o lobo lateral da cabeça, mas sim com o bater do coração sabe que a dor e a tristeza precedem uma transformação, e se é grato por elas, esse é o sentido de celebrar, mas aquele que se afoga na mágoa e no ressentimento é um espírito lamentável, ao invés de cultivar o desapego que lhe garante uma paz, finca com dentes e garras em seu objeto de tortura.
O militar nega seu corpo, nega sua vida, o que lhe resta é apenas um espaço dedicado ao culto de ideais de seus generais e nações. O militar cumpre um papel de missionário, um sacerdote, levando os destrutivos aspectos de sua cultura para outros, sejam indefesos ou não. E nós, que estamos tão longe dessa dimensão armamentista, de conflitos internacionais, e quem sabe jamais teríamos a coragem de pegar num rifle de guerra, seríamos esses militares, fanáticos de seus generais, seus sacerdotes?

Final da parte I
em breve continuarei...

Quanto mais se busca abordar um assunto, se tateia essa bordas que estão lá na extremidade que delimita o saber e o não-saber. As pessoas não falam do que sabem, falam apenas naquilo que está no limite de sua mente e seu coração, então qualquer coisa que for ler, ou ouvir, seja como um rio, inunde-se das palavras e idéias e e deixe-as seguir a correnteza, seja indomável.

abraços a todos