sábado, 7 de novembro de 2009

O império do Reciclar ou...

Dias atuais, todos já sabem a anamnese do planeta. Rios poluídos até sua última gota, pássaros caindo dos céus feito bombas de gás carbônico, das plantas resta um verde esfumaçado quase cinza.

A cidade das luzes, sufocada por uma densa névoa. Seus moradores, pálidos e colapsados como sua cidade. Já aderiram até seu último suspiro a esta paisagem feita de máquinas, gases e lixo tóxico que eles mesmos contruíram. Sujeitos? Não...

A cidade perdeu sua fábula. Se antes plantas, rochas e animais podiam se comunicar conosco, hoje são as máquinas que se comunicam por nós. E só entre elas. É ônibus que fala com farol, briga com os carros e enamora-se da caminhonete. Na indústria um robo fala com o outro, enquanto naquele canto silencioso, lá estãos seres que já compõem paisagem. Mas só a paisagem.

Quem somos nós que movimentamos sem brilho, cantamos sem paixão, olhamos sem alma?
Condenados a essa cinzetude? Mas quem nos encarcerou nesses cantos e recantos desse homem-máquina?

Até uma rocha que rola do topo da montanha para se espatifar possui uma qualidade de graça que já não acessamos mais. E nossa tristonha visão ainda quer nos reatar a esse mundo produzido em nosso torpor, guiando-se como moscas em torno de um reflexo de luz. É ouro de tolos. E quando o achamos, modificamos seu formato e jogamos novamente para a escuridão, onde mergulharemos nesse lodo pegajoso.

Felizes os animais, que carregam consigo um mundo de deleite sem se preocupar com dádivas amoedadas. Vivem aqui e agora. E nós, ainda temos a audácia de nos sentir envergonhadas com esse corpo nosso que é bicho. Como gostamos de inventar mentiras para que elas nos joguem para outro mundo, paraísos de prados verdejantes, onde faremos a atividade humana que mais prezamos, ruminar na grama feito bois. Queríamos ser bovinos! Rejeitamos até o bicho que a gente é para ser outro!

Mas aí que a gente se engana mais uma vez, queremos ser bovinos sem a qualidade de animal, isto é, queremos ruminar tudo aquilo que é feito de lembranças, sentimentos endeusados e ressentimentos sem jamais aceitar o momento que se passa agora. O boi abraça a vida, a gente deserda ela.

E quando antes sussurravam, hoje é aos gritos que aderimos à essa vida mecânica. Reciclar é a ordem. Reciclar não só latinhas de refrigerante, garrafas PET ou folhas sulfite. Têm-se também que reciclar padrões, comportamentos, pensamentos. A ordem é tornar tudo lixo, para derreter e fundir numa nova forma, mas mesma essência.

Assim se faz com o trabalho, mas não só com ele, com a identidade também. Mudou-se a forma do trabalho capitalista, mas essa produção intermitente de riquezas é ganho para quem, para as máquinas? Que elas são as mais beneficiadas com a produção. Elas estão no centro das atenções, e o resto é paisagem.

Identidade é uma coisa que se vem reciclando também. Aliás, é algo que nos tornamos viciados em reciclar, para que possamos consumir novas. Criar, inventar, experienciar outros fluxos? Não, os estilos permitidos são apenas aqueles que estão em alta no mercado mundial. Se não dá pra vender, em sociedade não vive.

É o imperativo do recicle! Recicle os ideais, os valores e os estamentos. Recicle sua vida. Mas jamais, repito, JAMAIS tente viver de uma forma que não está nas vitrines do mercado.

ou...
corra o risco de estar sensível a vida e a abrir fendas em teu corpo cimentado

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