domingo, 4 de abril de 2010

Por que escrever se faz uma atividade tão difícil?
Não só de colocar as palavras em atos, ou pincelá-las no fundo branco do word como diria um amigo.
Quem dera a dificuldade de escrever fosse a falta daquela palavra, aquela palavra mágica que destrincha mundos... mas não
Escrevo sobre o escrever porque não consigo escrever o que quero, o que me passa.
Estou insône, a cama não está convidativa. E nesse meio termo uma nuvem, algo gasoso que me dá náusea - e não é do lixo da cozinha.
Olho para o computador, ele olha pra mim. Me encara. Há algo de estranho nele.
Fico-o observando, é como se ele estivesse a ganhar vida, brotasse pernas e fugisse de mim...
ou quem sabe ele já o fez, e o que agora contemplo é um cadáver, um abismo de metal, plástico e chips - microchips.
Essa fascinação ao mesmo tempo que me é estranha, me é familiar...
queria que outra parte da casa fizesse barulho, um rato na cozinha, uma vassoura caindo na varanda, folhas voando da escrivaninha. E nada. Um pio sequer nem do menor dos seres daqui.
Ouço apenas a respiração, minha respiração, quebrada em movimentos para dentro e para fora, e esta outra respiração, contínua, um barulho a princípio enlouquecedor, mas logo nos acostumamos.
Respiração das ventoinhas. Se bastasse respirar, estaríamos ambos vivos, mas eu duvido que isso basta, não basta um computador respirar para ter vida, tal como não basta alguém respirar para ter vida, e muito menos inteligente...
Logo após um tempo, o corpo zune em ressonância com essa batida binária de 0s e 1s. Corpo que vira máquina, e a medida que maquiniza, produz.
Esta escrita, conjunção mãos-teclados, não é necessariamente original, mas uma escrita necessária. Parece-me que quando os dois estão juntos, eles teclam, teclam sem parar, sem se preocupar muito com o que vai sair. E cada vez o espaço de tempo da escrita diminui.
Pena não poderem ler à medida que isto vai se escrevendo. O blog não permite - poderia fazer um flash, mas isso exigiria um trabalho que no final não atenderia a esse (des)sentido.
E o chão vibra! Vizinho que vai buscar água no filtro. Não sei se há vida lá, mas sei que algo faz vibrar, já não somos um caso de amor eu e computador, outros sons se fazem.
O apito do guardinha, o som de um carro nômade, e de longe, bem baixinho, o som do mar revoltado.
Mas eu vou cansando, meu corpo vai cansando. Ele não, este outro corpo mantém-se imovél, operante, iluminado. Enquanto o meu vai escorregando pela cadeira...
O cansaço já me abate apesar de não haver sono. Já deste companheiro, só se vai porque não há mais quem teclar.
Enquanto isso prestarei em meu altar-cama as oferendas noturnas: meus sonhos, fracassos e minhas divagações. Oferenda precisa, para que se possa levantar mais um dia.

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