terça-feira, 4 de outubro de 2011

Hábitos de um espírito geológico

Faz da terra meu labirinto, minha contração, minha expiração. Sabia de tuas sabedorias e de tuas artimanhas. O desejo quis se firmar naquele lodo existencial, lá onde água, terra e luz se encontravam, lá onde a chama cintilava em labaredas, e crispava em melodias, acenos de um caminho cuja volta não conheciamos, e passamos a preferir não. Já não precisávamos conhecer, seguiamos, seguiamos até nos perder de nosso guia, e precisariamos caminhar logo cedo se não fosse nossa bússola encarnada insistindo em oferecer uma meta, e a insistência daquele ponteiro mergulhava naquele território, naquele país que parecia um conto de fadas, um daqueles contos nos quais nos encontramos a cada esquina, um abismo. Seja o fundo do poço, seja a boca da bruxa. Os olhos da harpia. O canto da sereia. O canto, o abismo mais profundo que pude me ater, sem o perceber logo estava me debatendo no fundo que aqueles timbres teciam, preso em uma teia de aranha de fios musicados. Enfim, o abismo me fazia deslizar, o mergulho naquela fantasia contraída havia se tornada meu hábito, tal como me tornei o hábito da terra, o hábito da matéria. Fabular, a terra fabulava, e eu, em minha breve condição de fabulação terrena podia apenas afirmar meu sopro, minha mineralidade naquele pequeno espaço que habitava. Precisava estar bem comprimido, bem junto cada parte, para assim não esgarçar. Cada fabulação da terra era a volta da guerra de Netuno, seus mares e suas tempestades inundando continentes, naufragando montanhas e nos empurrando direto ao abismo. Me disse calma, e deu o último suspiro. Só mais um de nós estava seguindo sua bússola, e era eu aquele incapaz de fazer um caminho qualquer, aquele caminho intuitivo que a fantasia faz criar nas cabeças vazias o suficientes, eu era, e quem sabe ainda seja um devorador de homens e suas humanidades, quem sabe por isso a dificuldade. Agia frente a bússola que pendia, tal como os homens e suas metas, mas já não era humano, já não era animal ou mesmo orgânico. Era um sopro mineral nas teias da sereia, naquele canto aracnídeo em que percebi que minha imobilidade se tratava não de seguir guias, setas, agulhas ou outros homens, mas de ser tão ingênuo de achar que de humanidades que me movimento. A sereia me convocou ao abismo do canto não por uma punição, mas para evocar o excesso do real em sua fantasia, para evocar os cosmos que me faziam a fabulação e o hábito da terra. Me convocou a devorar o abismo, a contrair o abismo. E contraído o abismo uma insensata sensibilidade fazia-me cristalino. Era o que era, um sonho contraído de terra, água, fogo e ar.

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