segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Artaud e Meireles num encontro saramagal

Eis Meireles quando diz não serei eu e que as datas as coisas os retratos o que foi dito e o que foi ouvido não será eu outra coisa apenas e que a unidade possível é uma breve unidade passional quebranta rachada lacônica de instantes mínimos em que a coesão produz o eu coesão díficil não forjada pelas sutis invenções nem as espertas engenhosidades eis Artaud que abomina a cruz e vive pelo osso arriscando a mostrar-se no osso diferentemente dos homens que se escondiam pela carne Artaud uma criatura louca que pergunta Deus é ser seguida da afirmação Deus é percevejo que se nutre do sangue dos corpos que ainda persistem em serem corpos Artaud uma criatura do apetite mas não da fome sufocado pela idéia de ser um corpo por produzir um gás fétido sufocarem-no com a insistência das perguntas até a ausência a anulação da própria pergunta Meireles e Artaud pecam Meireles e Artaud pecam pelos excessos de tua presença e pelos rumos de tua ausência de sentido ainda mais quando entram em contato pele a pele com mais um daqueles que já não habitam a carne enfim Saramago três habitantes da terra dos ossos que persistem a viver na insistência de nossos corpos e em intermezzo de nossas unidades celulares Artaud grita Artaud ruge contra a célula e o micróbio estes últimos ostentadores do juízo de Deus e Meireles pacificadora de tamanha vulcânidade de canção magmática invade corações fígados e intestinos com a coragem do não saber num encontro inusitado e cansativo inexplicável para levar à esta pequena razão da mente isto que é para além da existência e sua significação três viventes que enganaram a morte deliraram em intensas biografias estas espécies de ontologias na abrupta presenças dos corpos a vida que inspira o pensamento de modo que este a leve aos saltos saltos não escritos na história mas escritos à pele tingidos na memória os cortes as cisões os desgastes rupturas tingir na memória as quedas bruscas e sem fundo que levam uns à lua e outros aos balcões três ossaturas de inumeráveis constelações de identificação impossível na fuga de todo automatismo da ordem e do juízo numa revolução que não há lugar nem mesmo o lugar do corpo.

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