domingo, 28 de fevereiro de 2010

Areias de marte

Mais uma vez estava lá, peregrinando naquela imensidão vermelha. A cada passo atravessado, era a areia que atravessava meu corpo, que fazia meu pé deslizar para dentro da terra. Não é a primeira vez que estive lá. Não é mero sonho...estou lá. Minha pele sente a areia que soçobra com os ventos, ora se regozija, ora se racha.

A boca sente sede, está seca, mas não é água que a supre. Não... é outra sede. O corpo também não é o mesmo. Sei que habito diferentes corpos no espaço, que não sou algo que se restringe a um corpo orgânico, apesar que esse mesmo corpo orgânico não é apenas meu lar. Tais corpos são tendas. Tendas de um espírito nômade. Mas não são tendas de meu espírito nômade.

Da boca amarga escorre areia vermelha, o corpo ficou muito tempo no chão. E agora está a ser soterrado pelas tempestades marcianas.O corpo fica constrangido, as palavras constrangem, e a areia adentra. Fui infectado pela gravidade das coisas, tornei-me pesado como dizem que elas são. Fiquei tempo demais parado. É tarde demais para esse corpo. Corpo marciano. Passo, mas já não habito mais.

Agora tenho que ter prudência com os outros corpos que habito. Não soterrá-los com minha dureza, minha amargura, meu ressentimento. Seria uma crueldade soterrar esses corpos, apenas por eu querer me manter feito bicho-preguiça debaixo de uma tenda por tempo demais. As tempestades vêm a revelia de minha vontade. Peregrino não por vontade, mas por necessidade.

O nomadismo é minha vitalidade, minha liberdade. Liberdade que não faz parte dos quereres da vida. Necessidade que me faz escolher entre esse ou aquele caminho, deixando antigas tendas e suas tempestades para viver na imensidão do deserto.

Um comentário:

Anônimo disse...

"Agora tenho que ter prudência com os outros corpos que habito. Não soterrá-los com minha dureza, minha amargura, meu ressentimento. Seria uma crueldade soterrar esses corpos, apenas por eu querer me manter feito bicho-preguiça debaixo de uma tenda por tempo demais."