quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Pactos com a neutralidade

Se há alguma posição que o neutro adota, é aquela que neutraliza a vida
o neutro espera o futuro chegar para tomar uma decisão: ver o passado através das lentes que os parciais dominantes engendraram na história monumental
se os homens dizem-se neutro por compactuarem com fatos da pretensa "realidade universal", já denunciam a própria parcialidade subjacente ao ato de ser neutro
não existe um neutro transcedental, um território onde a ordem se regozija-se de um equilíbrio que não penda para nenhum dos braços da balança
única realidade que podemos apreender é a realidade humana, e a única ordem possível é de caráter humano, e por tal, necessariamente um ato de invenção
uma ordem humana é dada por uma consistência deste ato de invenção, por sua capacidade de durar e de sua autopoiese, ou seja, sua capacidade de a partir de seus próprios elementos mais os do campo reciclar-se
mas a ordem, assim como as técnicas que a produzem, além de se tornarem seus próprios objetos, imbricam-se como fontes instituintes de si mesmas. Assim, a invenção que toma consistência torna-se a própria fonte que institui sua duração, e a ordem fará o mesmo.
como não há ordem transcendental possível que a realidade humana apreenda em sua forma pura, a única ordem possível para o homem é uma ordem imanente, então antes de haver ordem humana lá estará o homem, e consequentemente para que a ordem continue ela depende da reprodução de seus elementos constituintes pelo homem.
Dessa forma a ordem não se reproduz em abstrato, nem a ciência, nem a técnica. São homem que fazem pactos com tais aparatos, e se fazem tais pactos é por interesse, e todo interesse é irremediavelmente parcial.
Disto se conclui que quaisquer que sejam os elementos trabalhados para constituir uma ordem, uma técnica ou uma ciência não são de modo algum neutros, pois o pacto necessita de uma escolha e seu consequente engajamento num mundo possível dentro do mundo humano.
e o homem faz escolhas não é por factualidades, mas por crenças de que aquele mundo que ele escolhe é o melhor dos mundos possíveis, e segundo a apreensão que tem da realidade humana, tal mundo é o melhor mundo possível a ser escolhido, pois o homem só pode escolher o maior prazer possível dentro de seu alcance.
ai que jaz a problemática do neutro. Uma ordem que se diz neutra, uma técnica que ignora a criação de universos psicossociais subjacente a seu (des)uso ou uma ciência que busca universalizar a linguagem fazem parte da formação de um tipo de sujeito, o sujeito parcial-neutro, o sujeito sem qualidades, útopico e sem gênero que se encaixaria como peça fundante de tais aparatos.
o neutro diz não escolher, mas escolhe a neutralidade, faz um pacto com a ordem neutra e reduz-se a um estado estático. Sua escolha é a inação, pois um mundo que é inativo é o seu melhor possível. Porém uma máquina inativa não é funcional, e por analogia um mundo inativo não é funcional e estará destinado ao colapso.
Mas dizem as ciências e as técnicas serem neutras, mas elas apresentam uma funcionalidade, logo elas não são inativas, e consequentemente não são neutras. Um de seus efeitos é a produção desse sujeito "neutro" que julga constituir este mundo melhor neutralizado, o que constitui nem um paradoxo, mas uma impossibilidade humana já que o mundo humano é parcial, não sendo passível de neutralização por parte humana, salvo a dizimação de todo e qualquer mundo humano.
Tal opção não nos cabe, e se o ocorrer, pouco nos interessa pois o que restar não o será humano, e por tal, não apreensível por nós.
De resto, o humano é nefastamente/graciosamente parcial

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