domingo, 21 de março de 2010

finding buddies

The question is not how we search for friends, the quest is to find them.


Encontrar. Digerir. Outrar. Não à irmandade, a amizade, o companheirismo não devém duma gregária filiação de sangue, de pátria, de idéias. Aquele que devém irmão toma o mundo como um emaranhado de iguais, mas que se enroscam com os não-iguais, logo unem-se para lavar o mundo da "sujidade" do diferente.

O irmão se identifica no outro, tomado como espelho seu umbiguismo, de seu narcisismo. O irmão não é uma aliança, mas uma submissão. É a vida que se expande circunscrita na prisão do identifismo, e que logo degenera nas paredes do rígido sufrágio universal - onde todos nos filiamos à uma raça humana, "não-animal", a uma instância neutra capaz de julgar a todos sob o prisma da navalha racional, essa lâmina branca portada pelo barbeiro. Corta o pêlo que remete à placenta animal, essa via que traz uma vida potente demais para os modelos pós-estabelecidos.

A questão não é o irmão, ou mesmo aquele em que haja uma relação de vizinhança. Amizade de iguais não é amizade, mas necessidade para com sujeitos empobrecidos, não capazes de assegurar a diferença que se desenha em seus corpos. No fracasso da afirmação do corpo, espera-se um reconhecimento exterior - o grande Outro que nos consola com a "verdade", seja o pai, o filho, o Estado ou o irmão.

A questão então não é, definitivamente, procurar semelhanças, mas sim em como encontrar alianças. Aí que se constitui a amizade, no campo de forças de interpretação, e não nos modelos representacionais. Componho uma aliança com o outro não por igualdade, mas porque ambos queremos expandir, ampliar aquilo que nos faz viver, e ampliar é toda hora sair da identidade e da representação - é compor novas interpretações das forças.

Uma nova interpretação só surge de um encontro, e a nova configuração surge da desconfiguração do original. Não é um simulacro que degenera da Idéia pura e abstrata. Mas um campo que continuamente se diferencia em si mesmo, que se desestabiliza de seu hábito para uma nova possibilidade de existir. Encontrar é diferir, mas apenas encontrar não basta.

O encontro pode nos promover a ação, assim como pode padecer nosso corpo. Logo a questão é ter prudência, nem todo encontro é potente, não é encontrar, apenas, que cria a amizade e a aliança. Há de fato encontros que impotencializam os homens e demais seres. O encontro produz. Ponto. O que se faz com a produção? O que se faz com a consequente produção que devém da produção? O que fazer com a produção de registros, de referenciações, de consumos, de distribuições? Temos que digerir o encontro, temos que digerir o processo.

Antropofagia, comer o homem, mas não apenas o homem, deve-se comer o inumano, o orgânico e o inorgânico para compor. Amizade é devorar bem o outro. Compor-se do outro. Compor-se com o outro que te devora. Encontra-se, come-se, digere-se, assimila-se, e por fim (e um novo começo), outra-se.

O irmão é a lei do incesto, uma impossibilidade, pois não há o que comer aqui. Não há encontro possível pois estamos presos sob a mesma redoma, somente diferindo e transgredindo esta redomas é que estabelecemos interfaces, planos de contato, linhas de fuga e de encontro. Aí se tece a amizade, num jogo de encontro e fuga, de desejo pelo que vive, de compor-se com aquilo que do outro é vital a mim, e de escapar do que é venenoso a mim. Digiro isso. Dirijo isso.

Faço aliança contigo que me é estranho. Já não sou mais o mesmo, outrei-me. Novamente busco estabelecer outras regiões de contato, pois já não somos os mesmos. É uma tarefa sem fim a amizade, é encontrar alianças, tecer corpos, compor uma poética de nossa existência. A grande aventura da existência: amizade.

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