segunda-feira, 22 de junho de 2009
Por uma vida menor
A vida é monótona, tudo que temos para falar sobre ela é uma cor, ou outra senão, em nossa febre de estabelecer limites, congruências, histórias romancescas, das que tem começo, meio e fim. Estamos permeados, estamos em conflito, estamos. Estamos aqui no campo, onde as coisas ocorrem, campo de conflitos edipidianos, aflições narcísicas, angústias e fragilidades. Somos inseguros, não temos mais platôs que nos deêm segurança, na verdade nunca tivemos, pois toda segurança foi uma construção humana, e o oceano da existência fez as bases dos platôs erodirem, acarretando seu colapso. Mesmo que construamos uma nova torre para refugiarmos dessa solene vida, a pertinência da mesma é apenas quanto à sua duração, séculos...anos...dias?
O homem não entende, sempre quis controlar, sempre quis destruir, sua vida sempre foi regida pelo medo, foi regida por sua neurose, sua desconfiança, sua traição. O homem é mais fiel à um tijolo de barro do que a si mesmo. Sua frágil vida é renegada em prol de uma frágil estatueta, um ídolo de barro.
E a vida que carrega é tão frágil, quem dirá da vontade que a sustenta? Uma vontade tão, senão mais frágil. Somos condenados a morrer ao mínimo choque, no primeiro confronto nossas energias se esvaem, no segundo confronto o ar que pulsa em nós se enclausura, o peito aperta, afunila, e por fim, num terceiro encontro já estamos esgotados e a mais sutil brisa arranca de nós nosso último suspiro. O que fazer dessa frágil vida? Buscamos um resgate dessa vontade, simples assim? Como se bastasse isso para resolver? Vida e vontade estão entrelaçados, e vivemos no interstício de ambas, nos esgueiramos pelos corredores, pois ficar totalmente exposto a qualquer uma que seja nos levaria a loucura, é no entre as coisas que somos potentes, dentro delas nós só repetimos a mesma lógica que nos torna aquilo que já somos.
Mas adoramos essa (im)potência! Queremos repetir a história da novela, a fábula dos contos de fadas, não importa se os tempos mudaram, não importa se o campo mudou, queremos fazer parte do elenco da gorda felicidade, unânime, pesada, obliterante. Um dos destinos mais perniciosos para o homem é o de buscar sua felicidade. Essa felicidade que vem de fora e age como um peso, achatando o homem, esmagando o homem, e nosso sadismo nos mantém nesse processo de trituração da integridade, felicidade é uma péssima questão. A potência que essa corrida à beatitude nos oferece é sua própria negação. Negavamos a vida em busca de um sentido superior, em nome de uma entidade supra-sensível, transcendental, e hoje nos despotencializamos pela substrato dominante da felicidade.
O homem traí a si mesmo quando busca uma melhora de si, fica preso à tradição que o encarcera, sendo marionete de um jogo de forças, amarrando fimemente sua próprias cordas com as quais será manipulado pelos deuses da ciência, da economia e do marketing, o homem traí a si quando adere a essa lógica de dominação, sua vida é grande, gorda, enorme, cheia de fast food, cheia de junk food dados pelos mestres que o manipulam, deixam-se levar pelos movimentos desses gigantes com a falsa promessa de segurança, esquecem que esses gigantes requerem sacrifícios, que esses gigantes o engolirão mais cedo ou mais tarde, e a segurança prometida foi uma farsa.
Um homem menor, uma vida menor, um agenciamento minoritário que não faça de seus predadores seus deuses, à vida tem sido injetado coisas demais, requer-se agora um esvaziamento da vida, um esvaziamento do homem, para quem sabe assim nos afunilar e poder sair das correntes que nos prendiam, sendo menores, estamos correndo mais riscos, estamos mais em contato com a dor, a angústia e a aflição, somos pequenos e corremos o risco de sermos esmagados pelos gigantes, porém podemos ter mais margem de manobra, temos mais espaços para esgueirarmos, podemos viver entre as coisas que os gigantes não alcançam por serem demasiadamente grandes, menores podemos virar pontos que os gigantes já não mais vêem, e seus tentáculos já não nos alcançarão mais.
Sair do já enjoado romance da novela familiar e partir para uma inusitada permuta de sentidos, de estilos, sermos mais estranhos, mais temperantes não porque nos dizem, mas porque há uma sabedoria que faz do pequeno, miúdo, frágil um ser que afirma essa vida de seu modo singular, e assim demonstra sua força, em revés os gigantes que se utilizam de seus tentáculos de controle e dominação já provaram sua fraqueza. Sejamos um multidão de minoritários, uma multidão de Davis que não permitam às máquinas colossais engendrarem o homem e a vida em seu mecanismo de esmigalhamento.
Uma vida menor, mas pelo menos, VIDA!
segunda-feira, 18 de maio de 2009
Curto espaço de um tempo perdido
O chão treme a cada vez que a Terra gira, lagos, rios e mares vibram, ondulam conforme o movimento celeste.
Dança de astros! Fluxo planetário, uma rajada de acontecimentos, luzes, explosões, radiações!
E debaixo das águas do oceano, um mar pulsante de lava, ascendendo e à superfície e voltando ao seu centro, coração de magma, pulsões efervescentes, rizomáticas, multi-arteriais.
Em sua crosta, alguns caminhos, alguns túneis que exalam seu calor, seu deleite, sua criação e sua destruição, vulcões, erupções renovando a pele que recobre este mundo, nova pele sobre pele, e a baixa pele volta aos poucos, lentamente a seu interior, derrete, vira sangue rochoso, e sai novamente. Dinamismo sem igual, singular em seu estágio, em sua condição.
Aqui vivemos, nesta criatura chamada Terra, essa multi, toti, trans-entidade, tão viva como o menor dos insetos, conceber nossa vida sem ela, isso é de tamanha impossibilidade, pois apenas aqui tivemos a singularidade de sermos eu e você, quem o somos hoje.
Eu e você, você e eu, frutos desse ventre arbóreo e rochoso, tuas águas nos sustentam e tuas riquezas fazem nosso progresso, essa mãe volátil a seu tempo. Sinto o chão vibrar em uníssono, não só chão. Vibra terra, vibra mar, vibra rocha, vibra floresta, vibra animal, vibra humano. Tudo vibrando, tudo a seu tempo, de tão rápido em um singelo espaço que se foi, já vibrou, foi-se indo o tempo. As máquinas começaram a vibrar, as grandes fornalhas começaram a vibrar, a toxicidade começou a vibrar, o desencontro, a intriga, a ignorância, a insensibilidade começaram a vibrar...
Os animais começaram a ofegar, foram desvibrando, não são mais animais, são artifícios de cozinha, destino abate. As árvores começaram a secar, foram desvibrando, não são mais árvores, são madeira, lenha, encosto, destino corte. Os peixes começaram a sufocar, foram desvibrando, são ossadas no mar, destino podridão.
Mundo de ossos e troncos partidos, terra desolado, deserto sem sol, frio e negro, vibra morte, vibra esquecimento. Falta, falta vida, falta ar, falta água, falta. Grandes ruínas do homem aqui jazem, já não há sequer um crânio vivo, tudo exterminado, tudo em estado de desvibramento, desmembramento.
O planeta desvibrou, seu sangue rochoso foi endurecendo, seu fluxo comprometido, suas aberturas fechadas por lixo, suas paisagens secaram, arroxeou-se, roxo dor, roxo solidão, roxo sem vida. De longe o planeta aquarela perdeu suas cores, perdeu seus encantos, perdeu sua vida.
Planeta aquarela desvibrou, desmanchou, e todo seu registro desapareceu na imensidão do espaço.
Já não houve mais tempo, tempo se perdeu, a vida se perdeu, o humano se perdeu, o curto espaço do vibrar de um planeta cessou, vida, alegria e loucuras cessaram, não há mais registro.
Planeta aquarela cessou sua existência há pouco tempo, aqui do planeta Terra quem poderia sequer saber de tal planeta, tão colorido e vibrante como o nosso, mas com um trágico destino.
A loucura de um aquareliano passa por aqui, está a cessar, a desvibrar, mas ainda há fracos resquícios de sua existência, loucura que revela mundo esquecido, loucura que tenta reaver a vida perdida, loucura que deseja virar as areias do tempo, revoltar-se ao tempo, voltar-se no tempo.
Loucura que permitiu, por um instante, a volta das vozes caladas em suas tumbas, vozes que gritam, que clamam, que choram o tempo perdido, as horas passadas, as noites sem sol. Lástimas de suas tumbas monocromáticas, soterrados em um lugar que não há nome, soterrados no esquecimento.
Desvibraram-se as vozes, desvibrou-se o louco, o silêncio dos mortos restou.
Nada ficou
sexta-feira, 15 de maio de 2009
Aos anjos nesta terra
O que estamos fazendo de nossos dias, de nossas horas, de nossos momentos? A cada dia que passa eu faço a questão - o que estamos investido em nossas vidas, e o que desinvestimos em consequência disso?
A gente pode fazer um apanhado geral do contexto que estamos vivendo, a pós-modernidade, os costumes de nossa época e nossos modos de se relacionar, mas isso vou fazer de um modo bem corrido, então perdoem o risco de ser simples demais sobre nossa situação.
Um enunciado que tem muito aparecido nestes últimos tempos é que vivemos numa sociedade narcísica, com um profundo investimento no eu, nisso que chamamos de si, e existe uma angústia, uma insegurança, e porque não dizer de um certo melindramento, perante o outro, o diferente. Para quem estiver mais interessado na questão da sociedade narcísica, eu aconselho a ler A cultura do narcisismo de Christopher Lasch para um futuro aprofundamento. Então, segundo esse autor, na cultura que ele analisou, que é a cultura norte-americana de décadas atrás, encontrou-se um padrão de sociabilidade que desinvestia nas relações com o outro e a dimensão pública, passando a um adensamento dos atos, das práticas e dos discursos sobre o indivíduo e a dimensão privada da vida. O que nos interessa isso? Interessa saber que apesar de isso se dar décadas atrás, ainda encontramos bastantes ressonâncias disso nos dias de hoje, no nosso cotidiano.
E outro texto que pode servir para ajudar nessa contextualização é A sociedade do espetáculo de Guy Debord, nele encontramos elementos que nos dizem um pouco sobre essa nossa obsessão pelas vidas e minuciosidades dos atores do espetáculo, nossas celebridades, e como acabamos usando elas como modelos em nosso processo de construção de identidades.
É referente a essas duas correntes de pensamentos que eu quero articular para pararmos um pouco e refletir, novamente, o que estamos fazendo de nós mesmos?
Quanto tempo dedicamos a decorar, estudar minuciosamente a vida de nossas celebridades, aquelas que aparecem na televisão, no cinema, nos estádios de futebol, nos shows de música, e queremos tornar-mo-nos elas, incorporar seu estilo, seu modo de vida, seus hábitos.
Quanto tempo dedicamos ao culto de um corpo perfeito, sob o modelo, que por acaso é baseado na exceção, de nossas celebridades, e nos tornamos infelizes por não estar dentro da norma, das regras e dietas do corpo?
E para cultivar esse corpo, esse estilo de vida, quantas vezes não deixamos de lado amigos, mães e pais, irmãos, filhos? O que deixamos de lado, desinvestimos para estar dentro desses modelos que se baseiam na exceção?
Eu quero lhes contar a história de uma mulher que mudou milhares de vidas. E por que digo contar ao invés de lembrá-los? Provavelmente ninguém ouviu sobre ela, ela partiu desse mundo há pouco mais de um ano, dia 12 de maio de 2008 seu espírito deixou seu corpo de 98 anos. Um dia depois de sua morte, um grande jornal nosso e de renome publicou em um breve artigo:
“Morreu ontem em Varsóvia, aos 98 anos, Irena Sendler, que salvou milhares de crianças judias durante a ocupação nazista da Polônia. Entre 1940 e 1943 Irena, que era assistente social, tirou 2500 crianças do Gueto de Varsóvia. Ela chegou a ser presa e torturada pela Gestapo em 1943, mas nunca revelou os nomes das crianças que salvou”.
E podemos dizer na ponta da língua qual o número do sapato de nossa celebridade favorita, mas não sabemos nada desses verdadeiros anjos que caminham entre nós e que dedicam suas vidas em prol de um ideal de fraternidade e amor. Uma frase que marca muito dessa mulher é sua explicação de porque ajudou essas crianças, judias ou não, que viviam nas vielas escuras de Varsóvia.
"A razão pela qual resgatei as crianças tem origem no meu lar, na minha infância. Fui educada na crença de que uma pessoa necessitada deve ser ajudada com o coração, sem importar a sua religião ou nacionalidade." - Irena Sendler
E nos dias atuais, o que fazemos? Ficamos cada vez mais absorvidos com a paranóia do fitness e das dietas, ficamos nessa busca obsessiva do corpo perfeito e da saúde, ficamos tão centrados nessas atividades pra quê? O que ganhamos com isso?
E pensar que antigamente, lá na época dos gregos, existiam os exercícios, treinamentos do corpo e da mente, mas essas práticas não eram a finalidade, mas o meio para se obter um determinado objetivo, que era ,digamos assim, sendo simplistas mesmos, um amor à Pólis, era uma forma de produção de estilos de vida que muitas vezes eram discordantes da hegemonia dos hábitos dominantes.
Hoje, essas práticas e exercícios tornaram-se finalidade, aquilo que era destinado à Pólis, à um outro, à uma certa alteridade, torna-se direcionado ao corpo, ao indivíduo, e agora são destinadas mais para a normalização da vida, um adestramento do corpo e dos estilos de vida à norma dominante do que um potencial de resistência cultural.
E agora?
Nesse adestramento do corpo sofremos, sofremos porque acreditamos hoje que nossos problemas se dão hoje por uma falta de responsabilidade perante a rotina e as práticas diárias que agem sobre o corpo. Aconselho a ler o que o professor do Instituto de Medicina Social da Uerj Francisco Ortega fala sobre esse tema em seu artigo Práticas de ascese corporal e constituição de bioidentidades. E esse adestramento de certa forma nos torna insensíveis a esse outro, quantas vezes pensamos nos necessitados e em como podemos ajudá-los, ou melhor, quando agimos para ajudar, como o fez Irena Sendler?
Podemos dizer que os dias atuais são bem mais tranquilos, e dispomos de muito mais conhecimentos, técnicas e recursos do que essa mulher fez durante a época do nazismo, mas apesar da abundância que temos à nossa disposição vivemos de forma mesquinha, pois não só negamos o outro, como perdemos o potencial das relações com esse outro, o que poderiamos ter construido com isso. Ao negar o outro, acabamos ficando mais pobres e não vivemos numa plenitude que poderia ser mais frutífera.
Eu espero que você não esteja confuso pelas voltas e voltas que dei até então, eu queria apenas mostrar o quanto acabamos vivendo num mundo que cada vez mais exclui o outro e que a gente se esquece que podemos investir em outra relação com o mundo, eu trouxe o exemplo de Irena Sendler, porém existem muitos outros exemplos que não são divulgados pelos nossos meios de comunicação, ao menos não com tamanha importância, e que esses exemplos nos fazem lembrar que é possível ser diferente e de fazer uma mudança, ter uma singularidade que inspire, torne-se uma luz que estimule outros a ver a vida de outra maneira.
Termino aqui com uma frase de Marcel Proust, e espero que ajude a reflexão, e não a complique ainda mais
"A verdadeira viagem de descobrimento não consiste em procurar novas paisagens, e sim em ter novos olhos" - Marcel Proust
quarta-feira, 13 de maio de 2009
A desmanchar
Precisamos desmanchar a vida constituida em nossa fetichização e tomar rumo, desmanchar para que novas formas de interação sejam feitas, sair da semiotização que nos é dada como é certa, parar de achar que tudo é ou tem que ser uma re(a)presentação do passado. Precisamos fazer uma força para desmanchar a trama de nossas vidas. Mas por que desfazer aquilo que já está tão bem fundamentado, que nos é conveniente apesar de não nos gratificar? Dá muito trabalho mudar, um trabalho psíquico enorme, mas se não o fizermos, para cairmos no risco de uma extrema alienação, dum fetichismo obsessivo e, claro, às nossas pequenas têndencias fascistas são dois tempos, estamos numa corda bamba, e se não prestarmos atenção, caímos no chão com a cara estampada no nosso pequeno estilo de vida, não conseguindo ver outros modos de viver, de interpretar e significar. É difícil para alguém com a cara atolada na lama olhar pros lados.
Fetiche, alienação e fascismo, esses três enunciados andam lado a lado. O fetiche é a fixação de uma semiótica, uma visão de mundo, um processo de significação-mundo, no fetiche somos seduzidos, hipnotizados a esse determinado objeto, há uma extrema necessidade de posse, seja fisicamente, ou seja uma dominação no campo mental, é como se colocássemos uma viseira em nós, para que não seja possível enxergar os outros lados da história, cavalos de corrida que obedecem a seu cocheiro, aquele poder que temos de fazer, de transformar é inibido em prol a uma ordem superior, o nosso feito, nosso poder-fazer já não é mais de nossa autoria, mas da autoria de nosso objeto fetichizado, este exerce um poder sobre nós que os efeitos e causas mal poderiam ser abordados nesse texto, e essa viseira que nós e que nos é colocada advém junto com a nossa alienação, ao deixar de ver outros mundos, outras óticas, o que nos resta? Resta acreditar que aquilo que está sendo feito sempre foi assim, numa lógica de territorialização-esquecimento, funciona assim, nós que somos seres que temos um poder sobre o fazer na realidade articulamos os elementos desta para criar uma concepção de vida, criamos um modo de interagir com esta realidade, mas o que acontece aqui? Acontece que ao criarmos esses estilos de vida, nós criamos territórios ondes os elementos da realidade se encontram, e os elementos que não eram úteis ou atrapalhavam a significação desse estilo de vida são marginalizados, negados e por fim esquecidos, tendemos a esquecer os processos e as forças que nos articularam a ser como somos, e se ficamos imersos na inconsciência, continuamos a ser agentes passivos dessas forças que atuam sobre nós e continuamos na alienação. E na alienação também encontramos a repulsa e o dogmatismo que ajudam a construir os pequenos fascismos diários que praticamos. E como esses fascismos cotidianos se apresentam? Sobre várias formas como preconceito, posturas irreflexivas, posições de dominação e qualquer ato, mesmo na conduta entre amigos e amantes, que seja contra o diálogo e a liberdade subjetiva, ser fascista é ser contra desterritorialização da vida em prol de novas articulações, é não perceber que na existência as coisas não sao isso "ou" aquilo, as coisas podem ser isso "E" podem ser aquilo, uma visão de mundo não dispensa a outra, mesmo a científica e a religiosa.
Desinvestir é a peça em questão no desmanchar, eu desmancho porque eu não quero mais investir nessa relação, nesse trabalho, nesse tipo de vida que venho levado, eu desmancho porque quero coisas diferentes, quero sair daquelas quatro paredes e aquele teto feito por mim e meus ancestrais que dizem nos proteger do lado destrutivo da vida, eu desmancho essa minha proteção porque eu quero ver a vida, e não mais sobreviver, quero estar imerso na vida.
Eu desmancho para viver.
domingo, 19 de abril de 2009
A noite de outono chegou
Entre os aromas à mesa, uma grande panela
Uma panela prateada sobre o fogo
Em seu interior, a mistura de queijos borbulhando
Aroma de ementhel, gruyere e parmesão
Invadindo minhas narinas e criando uma tempestade de sabores
O volátil vinho branco já se dissipa no ar
Causando nesse cômodo à luz de velas
O mais encantador efeito
Ao lado dos castiçais, os mais variados pães
E claro, não pode se faltar um vinho do porto pra acompanhar
Em uma bandeja opaca descansam as frutas
E essa mistura de luzes, odores e sombras
É o que torna o encontro mais agradável
Somente uma peça falta nesse conjunto
E esta peça é você meu anjo
Por mais que minhas palavras tentem negar
O que eu sinto meu coração não consegue esconder
Ele grita mais alto que o som de meus pulmões
Posso inspirar com toda força, minha voz se perde
Não consigo negar você, não consigo me segura com você
A cada segundo em sua presença, eu temo
Pois percorre em minhas veias, uma pulsão, uma força
E quero te agarrar no mesmo instante, mesmo que a situação não permita
Fazer de teu peito meu recanto, soçobrar em você
Ouvir cada som que emerge de seus lábios
E ver seu sorriso metalizado
Com você eu perco minha razão, e mesmo assim a supero
Pois se a razão é ficar sem você, prefiro ser um doido varrido
E na minha loucura vejo minha felicidade, e uma razão que transcende
Para viver as lamúrias da cabeça, prefiro a canção do coração
Me vem uma esperança ao estar com você
Quase não acredito no que vou falar
Mas a você, com toda minha seriedade me entregaria
Dizer eu te amo pra você
Ao acordar, ao dormir e toda vez que der vontade
Porque acho que nunca senti algo tão assim
Intenso, mas sutil, e me vem essa confiança
Que eu posso submergir em você
Ser romântico mais uma vez
E ter o prazer de jantar com você
Nessa ceia de outono
Com todo amor
Que eu venha a te amar...
quinta-feira, 5 de março de 2009
O gato da cerca
domingo, 11 de janeiro de 2009
Sondando a vaidade
Como somos vaidosos, e não buscamos apenas a aprovação de alguém, queremos que gregos, troianos, egípcios e mulçumanos, todos estejam aqui para nos cortejar, nos dar atenção que achamos que merecemos, somos ditadores do belo!
Dizemos o que tem e o que não tem valor, ditamos regras, leis, colocamos valores e crenças uns sobre os outros, se devorando mutuamente, causando rupturas constantemente, podemos pegar vários exemplos em nossa vida esquizofrênica, dividida.
A começar pelo reduto da moda, em suas passarelas os estilistas fazem a lei prima, a do como se vestir para se tornar elegante, bonito, chique, "estar na moda", e outra lei que também está implícita, não é só a roupagem de pano a quem eles controlam as feições, a roupagem de carne igualmente é moldada para um modelo cuja base é a exceção.
Mulheres magérrimas e homens hipertrofiados de músculos, as grandes corporações do ramo escolhem não só o que você tem que vestir pra entrar no jogo das adulações socias, mas juntamente decide quais os cuidados com o corpo você deve tomar, o que você pode ou não comer, beber ou até mesmo gostar.
Transformamos a vaidade pessoal, fizemos ela trancender seus limites, criamos a indústria da vaidade, um complexo para atiçar nossos pontos fracos, nossa necessidade de afeto e e interação social, para ter controle sobre parte de nossas vidas, onde uma concepção de belo predomina sobre a diversidade da vida.
Sejamos sensatos, onde que na natureza há projeto semelhante? Já viu um jardim de flores? Por acaso as orquídeas disputam com as rosas ou com as violetaas para verem quem é a mais bonita? Não parece ilógico essa disputa já que elas são plantas? Cada uma é única, cada uma tem sua beleza, sua forma ,seu aroma. Cada uma é singular do jeito que é!
E nós? Somos milhares de homens e mulheres, e não somos tão únicos como qualquer uma dessas flores? Cada um de nós teve sua trajetória de vida, suas alegrias e seus temores, cada um possui sonhos...e pesadelos, somos de tal complexidade, tal singularidade, que não entendo porque muitas vezes não passamos de uma massa amorfa guiada pela inconsciência, absorvendo valores que nos são jogados, e como esponjas nós simplesmente deixamos tudo entrar sem passar pelo crivo de nossa razão e muito menos de nossa emoção.
O desrespeito a nós, a nossa história, a nossas crenças, tudo para que possamos nos enquadrar, encaixar em um esquema de grupo, de sociedade, que nos considera lixo humano, ela é avessa a quem somos de verdade, ela quer tudo planejado, que tudo seja previsível para que possa continuar a existir a custas de seus indivíduos, seus integrantes, ela gera as barreiras entre os homens, criando a ilusão de que alguns são aptos a ser incluídos e viver na normalidade, enquanto outros não são merecedores do convívio, são excluídos, tratados como a escória da humanidade.
Mas quem é a verdadeira escória? Aqueles que usam seu status socias, suas riquezas e seus conhecimentos para firmar a cisão da humanidade ou simplesmente aqueles que não se encaixam num padrão determinado pela inquisição da verdade?
Já basta da vaidade de informar aos outros seus títulos, seus conhecimentos e seus tesouros, isso é efêmero, isso lhe traz a ilusão de estar dividido, separado dos outros. Cria-se um castelo de fantasias onde você vive e perde o contato com a realidade, com as consequências de seus atos, em sua cabeça você está cindido não da humanidade, pois você ainda integra essa comunidade planetária, o que acontece é que você cria uma fenda na terra, separando você de sua humanidade.
Você agora não é mais um ser humano espontâneo, vivo, simples e criativo, você é um constructo, um rôbo, uma programação. É um ótimo repetidor de informações, mas perdeu sua capacidade de sentir e de criar, suas emoções são pré-fabricadas, se baseiam no que os outros fariam em seu lugar, o que já foi feito em determinada situação, e você é incapaz de desconstruir e (re)construir conceitos, crenças e fórmulas porque você está tão preso a elas, às "verdades" ditas e contidas, que se algumas coisas nelas mudarem sua vida perde o sentido.
O centro de sua vida não é a vida em si, mas a idéia, a "verdade" implantada de como a vida deve ser, algo construído e alimentado por nós para continuarmos sendo servos das emoções, do intelecto, das idéias, da sociedade e todas construções humanas, deixar de tomar o papel de senhores de nosso mundo íntimo, sermos imperadores desse reino que se chama subjetividade, um campo único e que não segue as leis feitas por homens.
Mas não! Recusamos a tomar a dianteira, a responsabilidade por nossas vidas, temos medo, temos vaidade de sermos certinhos, de caminhar com a "verdade", somos algozes e vítimas dessa inquisição contra nós mesmos. Não queremos estar do lado incerto, do incógnito e do incomum, preferimos ficar na vaidade daquilo que já foi provado, do que já foi tentado, a seguir caminhos que são tão percorridos que não há mais nada de novo a se ver.
Tomar a soberania de nosso corpo, de nosso mundo íntimo não tem preço, não é algo especulavel, o valor é sem precedentes comparado a tudo que já foi conquistado por estas terras, mas para sermos senhores de si devemos exorcisar o fantasma da vaidade e quebrar as corrente que nós puxam para o convencional, é hora de aventurarmos, viver na incerteza dos rumos, caminhar as estradas da vida sem se preocupar se isso já foi feito ou não, o que importa é se libertar do medo de percorrer sua vida.