domingo, 30 de maio de 2010

Recados para um desconhecido

Ei! Você aí!
Visitante sem rosto, se me permite lhe dirigir algumas palavras, fique atento.
Não prossiga, pois cá não encontrará as bases de um progresso.
Não persiga, aqui não rege a lei da selva humana.
Não me siga, se não quer cair nos meus buracos.
Não me seja fiel, pois não há história para se reportar.

Aqui de homem, nada encontrará além da pele.
Vísceras, músculos e ossos foram destituídos. Pele desossada.
Uma bela imagem, moldada por artistas perspicazes. Mas é pele.
Não confunda pele com derme: a pelagem que nos recobre não se reduz aí.
Para dentro se avança num vazio sem rumo. Mas o que é o rumo pro vazio?
Tentativa de, movimento de. Mas não se objetiva.
Pele adentro a gente se sufoca nas dobras.
Tão vivas, nos emergem, nos raptam.

É de pele que somos feitos. E estamos diante de um frio desconhecido.
Buscamos todas que já passaram, cada pele que já vingou, e nos agasalhamos.
E entramos num paradoxo, quanto mais pele, mais frio sentimos.
Que é esse desconhecido que queremos tapar a todo custo?
Há um abismo gélido à nossa espreita? Mas qual o medo?
Por que não? Por que não o abismo? Quem sabe seja a pele o abismo.
Quem sabe é a pele o frio.
É hora de descamar, lixar esta pelagem e sair do terminal.

Visitante desconhecido, você não é mais o mesmo.
Bem-vindo

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